Contam que o vento deu sete voltas na capoeira, antes de chegar às palafitas, para avisar que era hora de as crianças irem para dentro de suas casas. As mães chegavam às janelas e contavam na poeira do chão batido as pegadas de seus filhos e descansavam. Quando uma delas distraiu-se, uma criança bem pequena – pela altura de uns quatro anos de idade – achou de procurar um pedaço de qualquer coisa que se escondia no meio da escuridão que a chuva fez. A chuva choveu e, quando ela vem desse jeito, ela alaga e invade tudo que vê pela frente. Quando a pequena caiu e a torrente já quase a levava embora, foi que sua irmã com cara de lua percebeu a tragédia e pulou dentro da água. A lua crescente que morava sempre em seu sorriso então brilhou, fazendo com que tudo lá embaixo se iluminasse e a pequena pudesse lhe alcançar a mão, pulando fora dali. A água tinha sede e fome de luz e, através do sorriso de lua, achou um jeito de guardar consigo um feixe que a lua dá e que a menina tinha na boca, misturando-se ao seu corpo franzino. A água é boba, pensou a menina, não pode pegar a luz; a água, que não era boba, pegou. Só não pegou e levou consigo a lembrança da bravura da menininha, que a bravura nem a água não leva. Uma iara perto dali logo pegou a menina para sua companhia e, quando a lua faltava no céu, ela parava de cantar e lhe contava histórias sem pé nem cabeça. E a menina enchia o lugar de luz e de sorrisos.