O mundo é um moinho mesmo

amoinho

Mais que em qualquer outra cultura popular de que eu tenha conhecimento, a música popular brasileira é especialmente pérfida, sádica, terrível e completamente inadequada para os pais e mães de crianças quase adolescentes. Da Menininha de Toquinho e Vinicius, passando pelo O Caderno de Chico Buarque, Antigamente de Paulo Tatit e até mesmo O Mundo é Um Moinho, de Cartola, a coleção de serestas melancólicas e avisos prévios de um mundo terrível no porvir é impressionante. O melhor que todas dizem é: não cresça se possível. Como se fosse possível….

É uma tristeza, ainda mais se pensarmos que o recado passado é de que é melhor ficar para sempre na infância, não crescer jamais. Como os personagens de Peter Pan, por exemplo.

Está muito certo que o país e o mundo não andam lá essas coisas e é sempre bom quebrar desde cedo altas expectativas e evitar decepções talvez inevitáveis, mas há um gosto amargo que permanece na boca de qualquer pai/mãe que se vê obrigado a dizer sobre o mundo externo, por primeiro, um alerta de cuidado. Além de ficar implícita uma espécie inegável de atestado de incompetência.

Daí a versos como “o mundo é um moinho, vai triturar teus sonhos tão mesquinhos” e “fique assim, meu amor /sem crescer/porque o mundo é ruim, é ruim e você/vai sofrer de repente/uma desilusão” serem tidos como amorosos é de uma violência absurda. Para mim, são dignos de um Edgar Allan Poe de ressaca. E, bem.. A verdade é que, em se tratando dos citados compositores, talvez pelo menos a ressaca seja verdadeira…

No mundo da música pop estrangeira, por outro lado, a adolescência é exaltada e seu comportamento já nem tão infantil, nem ainda adulto, completamente idealizado. Por diversos artifícios da cultura, é feito um mundo de demandas insaciáveis de consumo cuja forma de satisfazer vai criar, mais tarde, insatisfações severas e inevitáveis violências paralelas ou perpendiculares. Talvez por isso haja mesmo uma necessidade em avisar previamente aqueles que abandonam as brincadeiras e bonecas de que, afinal de contas, o mundo é um moinho mesmo..

Longe de mim querer tolher dos meus filhos o seu crescimento inevitável. Como qualquer pai, é lógico que preferiria que ficassem brincando aos meus pés por longos e inumeráveis anos, pra que mentir? Porém, como não é possível e é necessário seguir o exemplo dos que vieram antes de mim, o mais prudente é deixar a roda continuar a girar, porque sabidamente o efeito de mantê-la em inércia costuma ser pior que a encomenda. Ainda assim, por uma intuição paterna diversa daquela dos grandes compositores da MPB, vou tentar evitar assustá-los demais do que eu mesmo colaborei em fazer.

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