Todos os dias
aconteces cedo,
quando a primeira luz
ainda não ligou
teu autorama atropelado
que as sirenes da noite
por alguma razão
que eu não entendo
em alguma hora da noite
silenciaram.
Esse despertador desorientado
que ofereces acorda também
certo rumor intestino teu.
Ele me alcança os ouvidos
com sotaques que não manténs
e do eco desses
animais alucinantes
e de gente que também
é fantástica demais
para que pareça real
(mesmo à memória,
que aceita tudo)
e assim me sobrescreves
todos os dias.
Um dia desses
precisamos entrar
em acordo com isso –
e justamente.
Mas então como ficariam
as coisas que não se acomodaram
perfeitamente em ti?
E como é que ficariam
aqueles que te armazenaram
como o cenário de vidas
delicadamente pouco importantes?
Não farias nada?
Quanto agressiva tu sabes ser, cidade
nada imperfeita e nem torta
e que, sobe lomba e desce lomba,
esconde-se num espelho brônzeo
e se magnetiza?
Mas ao menos uma coisa é certa:
tu és imparcialmente boa e ruim
e, às vezes, podemos imaginar
a vida noutro lugar
enquanto fertilizas
em nós coisas estranhas como
músicas, filmes, saudades, poemas…