Nude ants

É maio de 1979. Você dá por si e bem que poderia estar em Nova York, no Village Vanguard, escutando a gravação de Nude Ants (mas que título é esse, “formigas nuas”?). Tudo ali é muito curioso. Mas, nesta noite, tudo deve ser mesmo muito curioso, portanto acomode-se. Tente não estranhar nada. E, afinal, você sabe que não entende nada mesmo. E se tentar entender, adeus, já está perdendo, já está perdido. Não é meio estranho ouvir esse sujeito do sax improvisando, ele que nunca pareceu à vontade com isso, ele simplesmente aceitou todos os pontos de fuga solicitados pelo piano e que o contrabaixo não deixou sem costura e o baterista não permitiu desabar. E as coisas vão indo desde o começo de um modo impensado. Obstinados como formigas, eles comunicam-se apenas pelas ondas sonoras e olhares relampejantes. KJ está, como sempre, de olhos fechados na maior parte do tempo. JG, pelo contrário, está vertical como uma palmeira. PD sorri para todos (não sei a razão, mas contrabaixistas sempre sorriem para todos; parece que ele está dizendo-lhes algo como “podem viajar” aí que eu busco vocês) e JC, bem, você não deve tentar entender isso, JC pensa que está tocando piano nos cymbals – e o pior: você pensa que está entendendo perfeitamente. Nude Ants é de uma música doce demais para o jazz estridente do fusion. É estridente demais para o smooth vindouro. Era música demais para um neófito como eu, que o conheceu da forma certa, subfluindo tanto na delicadeza de Innocence, ouvindo a esmo os trinta minutos de Oasis, quanto na balbúrdia extasiante de New Dance. E as formigas, e nuas ainda por cima? Meu amigo, minha amiga, se depois disso você ainda consegue pensar em formigas, é claro que elas só poderiam estar mesmo nuas..

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