Para mim, que sou avesso às listas de melhores, chega a ser uma sordidez dizer que, na minha opinião, estes sejam alguns dos discos mais importantes da música brasileira.
Todos são de música instrumental e é por isso mesmo que para mim eles são dos mais importantes. Para mim, muitas vezes a música instrumental – por estranho que possa parecer – “fala” mais que a música cantada, com letra.
É que a exigência expressiva da música instrumental é essencialmente superior à canção letrada. Tendo de trazer significantes exclusivamente sonoros, livremente musicais, a ênfase na mensagem necessita ser muito mais amplificada. É nesse sentido que eu posso dizer que estes sejam, no meu modo de perceber, os mais importantes, porque comportam e veiculam a musicalidade no seu estado mais puro e incorruptível. E são ainda mais importantes porque são discos autorais. E porque, apesar de serem músicos que serviram ao trabalho de letristas talentosos e intérpretes excepcionais, sua música fala por si só e, ao mesmo tempo, compõem cada qual um universo muito particular. Além disso, são essencialmente brasileiros e trazem a influência popular transposta numa elaboração maior, mais refinada, e nem por isso afetada.
A minha sordidez reside em apontar que não temos no Rio Grande do Sul, até hoje, um disco nessas condições, um compositor nesse nível de composição e com recepção universal.
Pessoas me lembrarão de Yamandu, certo, Yamandu tem público onde for, mas o seu trabalho maior ainda é o de intérprete. Como compositor, dificilmente alguém consegue apontar de memória uma gravação ou tema inesquecível de sua autoria.
Tem também que o seu apogeu acontece justamente no declínio da cultura do disco. Se tivesse gravado nos anos 80 ou 90, época em que a qualidade das gravações brasileiras teve seu auge, talvez a situação fosse outra. Yamandu é um músico da era do single, na qual ninguém mais ouve um disco do início ao fim.
É claro que nada disso diminui a sua grandeza, mas, de fato, essa conjugação autoral ele ainda não conseguiu fazer na sua brilhante carreira de músico. Falta-lhe popularizar-se como compositor e dadas as condições de execução disponíveis, não se pode mais garantir essas coisas para ninguém.
Nesse ponto, eu diria que o músico com essas melhores condições no Rio Grande do Sul ainda chama-se Renato Borghetti. Mas Borghetti, decerto por uma ainda mais radical identificação e caracterização gauchesca, dificilmente um dia será apreciado na medida em que mereceria por suas características e não pelos preconceitos que lhe colam.
Sorte diferente têm estes outros três senhores. Ninguém lhes diz baiano demais, mineiro demais ou fluminense demais..
Fato é que, além do talento e de uma marca pessoal altamente elaborada, todos eles elevaram a musicalidade popular até chegar a um paradoxal alto nível de simplicidade formal. É impossível ouvi-los e não pensar imediatamente no Brasil. Se resta alguma dúvida, é suficiente usar os links abaixo.
Toninho Horta (Igreja do Pilar)
Dori Caymmi (Porto)
Egberto Gismonti (Lôro)
Renato Borghetti (Sétima do Pontal)
