Antílope, 2

Por um momento só
o paraíso abre suas portas.

Lá dentro não há um deus,
mas um antílope

e ele tem a clavícula quebrada
e usa uma bengala torta

que guarda
num leito de relva e veludo.

Um deus que soubesse
seu nome o chamaria,

mas nem ele e nem eu
estamos interessados.

Há dor demais com que lidar
e os ossos internos a percutir

um parentesco remoto
entre nós (mas nós esquecemos

de tudo em solidão). E roemos
com as mãos as unhas dele,

do casco que nos engasga
e a pele de que nos cobrimos.

Furtivamente nos procuram,
mas sem identificar.

A porta aberta continua aberta.
Nós já não queremos sair.

Deixamo-nos confundir
pelo sol. E as árvores

nos derrubam como a folhas
soltas, perdidas, que voam.

Não estão mais aqui.
Não estamos.

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